Joseph Cornell nasceu em 1903 e passou grande parte da sua vida na sua casa de Queens, acompanhado pela mãe e pelo irmão. Ávido coleccionador de quinquilharia, aproveitava as suas andanças como vendedor para bater todas as dime stores de NY, em busca de tralha diversa que acumulava e catalogava como se de memórias queridas se tratasse. Ao organizar e recombinar esses rastos de vidas alheias, fazia surgir do lixo obras únicas: as suas caixas.
Estas peças, embora formalmente quase invariáveis e minimais (alguns objectos encerrados numa caixa, por vezes com um fundo decorado e tampa de vidro), pegaram na mecânica dos ready-mades de Duchamp e trasladaram-na para uma dimensão profundamente original e evocativa. A imaginação de Cornell pode mostrar-se enigmática, pícara,teatral, sonhadora e intrincada ou até romântica; mas carrega sempre uma intensidade poética gentil e inconfundível.
Reconhecido pelos surrealistas como um irmão, Cornell nunca conseguiu abraçar o "lado negro" do Surrealismo; a fantasia nostálgica interessava-lhe muito mais do que os profundos estremecimentos psíquicos que Breton anunciava. As suas caixas são como microcosmos melancólicos, encapsulados pela segurança dos seus vidros; oásis em que o tempo se suspende, longe de ameaças, tensões eróticas ou urgências políticas.
Nos anos finais da sua carreira, Cornell enfrentou dificuldades quase tragicómicas: faltou-lhe a matéria-prima. A sua arte nutria-se de um subtil mas decisivo divórcio das suas circunstâncias geográficas (notável é o carácter apaixonadamente francófilo de tantas obras de um artista que nunca colocou um pé em França...) e do seu tempo; ao ver esgotar-se a quinquilharia "antiga", impregnada de saudades de locais e dias distantes, o artista viu-se privado de memórias com que trabalhar...
Depois de morrer, em 1972, Joseph Cornell foi, claro está, cremado e enterrado dentro de uma pequena caixa.
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